quinta-feira, 30 de julho de 2009

III. O CHEFE DO ESPIRITISMO


Mas quem estará encarregado de manter o Espiritismo nesse caminho?

Quem terá o lazer e a perseverança para se entregar ao trabalho incessante que exige semelhante tarefa?
Se o Espiritismo estiver entregue a si mesmo, sem guia, não é de se temer que se desvie de sua rota?

Que a malevolência, com a qual estará em luta por muito tempo ainda, não se esforce em desnaturar-lhe o espírito?

Aí está, com efeito, uma questão vital, e cuja solução é de um interesse maior para o futuro da Doutrina.
A necessidade de uma direção central superior, guardiã vigilante da unidade progressiva, e dos interesses gerais da Doutrina, é de tal modo evidente, que se inquieta por não ver ainda o condutor despontar no horizonte.

Compreende-se que, sem uma autoridade moral capaz de centralizar os trabalhos, os estudos e as observações, de dar impulso, de estimular o zelo, de defender o fraco, de sustentar as coragens vacilantes, de concorrer com os conselhos da experiência, de fixar a opinião sobre os pontos incertos, o Espiritismo correria o risco de caminhar à deriva.

Não somente essa direção é necessária, mas é preciso que ela esteja nas condições de força e de estabilidade suficientes para desafiar as tempestades.

Aqueles que não querem nenhuma autoridade não compreendem os verdadeiros interesses da Doutrina; se alguns pensam poder se passar de toda direção, a maioria, aqueles que não crêem em sua infalibilidade e não têm uma confiança absoluta em suas próprias luzes, sente a necessidade de um ponto de apoio, de um guia, não fosse senão para ajudá-los a caminhar com mais firmeza e segurança. (Ver a Revista de abril de 1866, p. 111: O Espiritismo independente.)

Estando estabelecida a necessidade de uma direção, de quem o chefe terá os seus poderes?

Será aclamado pela universalidade dos adeptos?

É uma coisa impraticável. Se se impõe com a sua autoridade privada, será aceito por uns, rejeitado pelos outros, e vinte pretendentes podem surgir que levantarão bandeira contra bandeira; isso seria, ao mesmo tempo, o despotismo e a anarquia.


Semelhante ato seria o fato de um ambicioso, por isso mesmo orgulhoso, a dirigir uma doutrina baseada sobre a abnegação, o devotamento, o desinteresse e a humildade; colocado fora do princípio fundamental da doutrina, não poderia senão falsear-lhe o espírito.

É o que ocorreria inevitavelmente, se não se tomassem, de antemão, medidas eficazes para evitar esse inconveniente.

Admitamos, no entanto, que um homem reunisse todas as qualidades requeridas para o cumprimento de seu mandato, e que chegue à direção superior por uma caminho qualquer: os homens se sucedem e não se assemelham; depois de um bom, pode vir um mau; com o indivíduo, pode mudar o espírito da direção; sem ter maus desígnios, pode ele ter objetivos mais ou menos justos; se quiser fazer prevalecer as
suas idéias pessoais, pode fazer a Doutrina desencaminhar, suscitar divisões e as mesmas dificuldades se renovarão a cada mudança.

Não é preciso perder de vista que o Espiritismo não está ainda na plenitude de sua força; do ponto de vista da organização, é uma criança que começa só a caminhar; importa, pois, no início sobretudo, premuni-lo contra as dificuldades do caminho.

Mas, dir-se-á, um dos Espíritos anunciados, dos que devem tomar parte na regeneração, não estará à testa do Espiritismo?

É provável: mas como não terão na fronte uma marca para se fazerem conhecer, que não se afirmarão senão pelos seus atos, e não serão, para a maioria, reconhecidos como tais senão depois de sua morte, segundo o que tenham feito durante a sua vida; que, aliás, não o seria perpetuamente, é necessário prever todas as eventualidades.

Sabe-se que a sua missão será múltipla: que a terá em todos os graus da escala, e nos diversos ramos da economia social, onde cada um exercerá a sua influência em proveito das idéias novas, segundo a especialidade de sua posição; todos trabalharão, pois, para o estabelecimento da Doutrina, seja numa parte, seja numa outra; uns como chefes de Estados, outros como jurisconsultos, outros como magistrados, sábios, literatos, oradores, industriais, etc.; cada um dará as suas provas em sua parte, desde o proletário até o soberano, sem que nada além de suas obras o distinga do comum dos homens.

Se um deles deve tomar parte na direção, é provável que estará colocado providencialmente em posição de ali chegar pelos meios legais que serão adotados; circunstâncias, em aparência fortuitas, o conduzirão, sem propósito premeditado de sua parte, sem mesmo que tenha consciência de sua missão.

(Revista Espírita: Os messias do Espiritismo, fevereiro-março de 1868, páginas 45 e 65.)

Em semelhante caso, o pior de todos os chefe será aquele que se der por eleito de Deus.

Como não é racional admitir que Deus confia tais missões a ambiciosos, ou a orgulhosos, as virtudes características de um verdadeiro messias devem ser, antes de tudo, a simplicidade, a humildade, a modéstia, em uma palavra, o desinteresse material e moral mais completo; ora, só a pretensão de ser um messias, seria a negação dessas qualidades essenciais; ela provaria, naquele que se prevê semelhante título, ou uma tola presunção se for de boa-fé, ou uma insigne impostura.

Não faltariam intrigantes, supostamente Espíritas, que quereriam se elevar pelo orgulho, ambição, cupidez; outros que teriam pretensas revelações com a ajuda das quais procurarão se pôr em relevo e fascinar as imaginações muito crédulas. É preciso prever também que, sob falsas aparências, os indivíduos poderiam tentar se apoderar do leme com pensamento dissimulado de fazer o navio naufragar, desviando-o de sua rota.

Não sossobrará, mas poderá experimentar deploráveis atrasos, que é preciso evitar. Esses são, sem contradita, os maiores escolhos dos quais o Espiritismo deve se resguardar: quanto mais ficar consistente, mais os seus adversários lhe dirigirão ciladas.

É, pois, do dever de todos os Espíritas sinceros frustrar as manobras da intriga, que se podem urdir nos menores centros, como nos maiores.

Deverão, antes de tudo, repudiar, da maneira mais absoluta, quem se colocar, por si mesmo, como um messias, seja como chefe do Espiritismo, seja como simples apóstolo da Doutrina.


Conhece-se a árvore pelo seu fruto; esperai, pois, que a árvore dê seu fruto antes de julgar se é bom, e olhai ainda se os frutos estão estragados.

(O Evangelho Segundo o Espiritismo, cap. XXI, nº 9. Caráter do verdadeiro profeta.)

Foi proposto fazer os próprios Espíritos designarem os candidatos, em cada grupo ou sociedade espírita.

Além de que esse meio não obviaria todos os inconvenientes, deles haveria especiais nesse modo de proceder, que a experiência já demonstrou e que seria supérfluo lembrar aqui.

É preciso não perder de vista que a missão dos Espíritos é de nos instruir, de nos melhorar, mas não de se substituir à iniciativa de nosso livre arbítrio; eles nos sugerem pensamentos, nos ajudam com os seus conselhos, sobretudo no que toca às questões morais, mas deixam ao nosso julgamento o cuidado da execução das coisas materiais que não têm por missão nos poupar.

Que os homens se contentem por serem assistidos e protegidos pelos bons Espíritos, mas que não descarreguem neles a responsabilidade que incumbe ao papel do encarnado.
Esse meio, aliás, suscitaria mais embaraço do que se pensa, pela dificuldade de fazer todos os grupos participarem nessa eleição; isso seria uma complicação nos maquinismos, e os maquinismos são tanto menos suscetíveis de se desorganizarem, quanto sejam mais simplificados.

O problema é, pois, constituir uma direção central nas condições de força e estabilidade que o coloque ao abrigo das flutuações, que respondem a todas as necessidades da causa e opõem uma barreira absoluta aos enredos da intriga e da ambição.

Tal é o objetivo do plano do qual vamos dar um esboço rápido.

quarta-feira, 29 de julho de 2009

IV. COMISSÃO CENTRAL


Durante o período de elaboração, a direção do Espiritismo teve que ser individual; era necessário que todos os elementos constitutivos da Doutrina, saídos no estado embrionário de uma multidão de focos, desembocassem num centro comum, para ali serem controlados e confrontados, e que um só pensamento presidisse à sua coordenação para estabelecer a unidade no conjunto e a harmonia em todas as partes.


Se fora de outro modo, a Doutrina parecer-se-ia a um mecanismo cujas rodagens não se engrenariam com precisão umas com as outras.

Já o dissemos, porque é uma verdade incontestável, claramente demonstrada hoje: a Doutrina não poderia sair de todas as peças de um só centro, como toda a ciência astronômica de um só observatório; e todo centro que tentasse constituí-la sobre as suas únicas observações, teria feito alguma coisa incompleta e se encontraria, numa infinidade de pontos, em contradição com os outros. Se mil centros tivessem querido fazer a sua doutrina, não haveria dois semelhantes sobre todos os pontos. Se estivessem de acordo pelo fundo, estariam inevitavelmente diferentes pela forma; ora, como há muitas pessoas que vêem a forma antes do fundo, teria havido tantas seitas quanto as formas diferentes.


A unidade não poderia sair senão do conjunto e da comparação de todos os resultados parciais; por isso, a concentração do trabalho era necessária. (A Gênese, cap. I, Caracteres da revelação espírita, nº 54 e seguintes.)

Mas o que era uma vantagem por um tempo, tornar-se-ia mais tarde um inconveniente. Hoje, que o trabalho de elaboração está terminado, no que concerne às questões fundamentais; que os princípios gerais da ciência estão estabelecidos, a direção, da individualidade que deve ter sido de começo, deve tornar-se coletiva; primeiro, porque chega um momento em que seu peso excede as forças de um homem, e, em segundo lugar, porque há mais garantia de estabilidade numa reunião de indivíduos, dos quais cada um não tem senão a sua voz, e que nada podem sem o concurso uns dos outros, do que num único, que pode abusar de sua autoridade e querer fazer prevalecer as suas idéias pessoais.

Em lugar de um chefe único, a direção será entregue a uma comissão central permanente, cuja organização e atribuições serão definidas de maneira a não deixar nada ao arbítrio.

Essa comissão será composta de doze membros titulares, no máximo, que deverão, para esse efeito, reunir certas condições requeridas, e de um número igual de conselheiros.

Completar-se-á, ela mesma, segundo as regras igualmente determinadas, à medida das vagas pela extinção ou outra causa. Uma disposição especial fixará o modo de nomeação dos doze primeiros.

A comissão nomeia o seu presidente por um ano.

A autoridade do presidente é puramente administrativa; ele dirige as deliberações da comissão, zela pela execução dos trabalhos e pela expedição dos assuntos; mas, fora das atribuições que lhe são conferidas pelos estatutos constitutivos, não pode tomar nenhuma decisão sem o concurso da comissão. Portanto, nada de abusos possíveis, nada de alimentos à ambição, nada de pretextos de intrigas e de ciúme, nada de supremacia contundente.

A comissão central será, pois, a cabeça, o verdadeiro chefe do Espiritismo, chefe coletivo, nada podendo sem o consentimento da maioria. Suficientemente numerosa para se esclarecer pela discussão, não o será bastante para que haja confusão.

A autoridade da comissão central será moderada, e seus atos controlados pelos congressos ou assembléias gerais, sobre os quais se falará adiante.

Para o público de adeptos, a aprovação ou a desaprovação, o consentimento ou a recusa, as decisões, em uma palavra, de um corpo constituído, representando uma opinião coletiva, terão forçosamente uma autoridade que elas jamais teriam emanando de um único indivíduo, que não representa senão uma opinião pessoal. Freqüentemente, rejeita-se a opinião de um só, crendo-se humilhante de submeter-se a ela, e aceita-se sem dificuldade, a de vários.

Está bem entendido que se trata aqui de uma autoridade moral, no que concerne à interpretação e à aplicação dos princípios da Doutrina, e não de um poder disciplinar qualquer.

Essa autoridade será, em matéria de Espiritismo, a de uma academia em matéria de ciência.

Para o público estranho, um corpo constituído tem mais ascendência e predominância entre os adversários; sobretudo, apresenta uma força de resistência e possui meios de ação que um indivíduo não poderia ter; luta com infinitamente mais vantagem. Atacam uma individualidade, despedaçam-na, não ocorrendo o mesmo com um ser coletivo.

Há igualmente, num ser coletivo, uma garantia de estabilidade que não existe quando tudo repousa sobre uma só cabeça; que o indivíduo esteja impedido por uma causa qualquer, tudo pode se entravado. Um ser coletivo, ao contrário, se perpetua sem cessar: que perca um ou vários de seus membros, nada periclita.

A dificuldade, dir-se-á, será a de reunir, de maneira permanente, doze pessoas que estejam sempre de acordo.

O essencial é que estejam de acordo sobre os princípios fundamentais; ora, isso será uma condição absoluta de sua admissão, como a de todos os participantes de sua direção.

Sobre as questões pendentes de detalhe, pouco importa a sua divergência, uma vez que é a opinião da maioria que prevalece. Àquele cuja maneira de ver for justa, não faltarão boas razões para justificá-la. Se um deles, contrariado por não poder fazer admitir as suas idéias, se retira, as coisas não seguem menos seu curso, e não haveria lugar de lamentá-lo, uma vez que faria prova de uma suscetibilidade orgulhosa, pouco espírita, e que poderia tornar-se uma causa de perturbação.

A causa mais comum de divisão entre os co-interessados é o conflito dos interesses e a possibilidade, para um, de suplantar o outro em seu proveito. Esta causa não tem nenhuma razão de ser, desde o instante que o prejuízo de um não pode aproveitar aos outros, que são solidários e não podem senão perder em lugar de ganhar com a desunião. Eis uma questão de detalhe prevista na organização.

Admitamos que, entre eles, se encontre um falso irmão, um traidor, ganho pelos inimigos da causa; que poderá ele, uma vez que não tem senão sua voz nas decisões? Suponhamos que, por impossível, a comissão inteira entre num mau caminho: os congressos lá estarão para pô-la em ordem.

O controle dos atos da administração estará nos congressos, que poderão decretar censura ou acusação contra a comissão central, por causa de infração ao seu mandato, de desvio dos princípios reconhecidos, ou de medidas prejudiciais à Doutrina.

É por isso que se apelará ao congresso nas circunstâncias em que se julgue que a sua responsabilidade poderia ser comprometida de maneira grave.

Se, pois, os congressos são um freio para a comissão, esta haure uma nova força em sua aprovação. É assim que esse chefe coletivo realça em definitivo a opinião geral e não pode, sem perigo para si mesmo, se afastar do caminho reto.

As principais atribuições dessa comissão central serão:


1º O cuidado dos interesses da Doutrina e a sua propagação; a manutenção de sua utilidade pela conservação da integridade dos princípios reconhecidos; o desenvolvimento de suas conseqüências;

2º O estudo dos princípios novos, suscetíveis de entrar no corpo da Doutrina;

3º A concentração de todos os documentos e informações que podem interessar ao Espiritismo;

4º A correspondência;

5º A manutenção, a consolidação e a extensão dos laços de fraternidade entre os adeptos e as sociedades particulares de diferentes países;

6º A direção da Revista, que será o jornal oficial do Espiritismo, e à qual poderá ser acrescentada uma outra publicação periódica;

7º O exame e a apreciação das obras, artigos de jornais, e todos os escritos interessando à Doutrina. A refutação dos ataques, se for o caso;

8º A publicação das obras fundamentais da Doutrina, nas condições mais propícias à sua vulgarização. A confecção e a publicação daquelas das quais daremos o plano, e que não tivermos tempo de fazer em nossa vida. Os encorajamentos dados às publicações que poderão ser úteis à causa;

9º A fundação e a conservação da biblioteca, dos arquivos e do museu;

10º A administração da caixa de assistência, do dispensário e do asilo;

11º A administração dos negócios materiais;

12º A direção das sessões da sociedade;

13º O ensino oral;

14º As visitas e instruções às sociedades particulares que se colocarem sob o seu patrocínio;

15º A convocação dos congressos e das assembléias gerais.


Essas atribuições serão repartidas entre os diferentes membros da comissão, segundo a especialidade de cada um, os quais, se for preciso, serão assistidos por um número suficiente de membros auxiliares, ou de simples empregados.

V. INSTITUIÇÕES ACESSÓRIAS E COMPLEMENTARES DA



Várias instituições complementares da comissão central a ela serão anexadas, como dependências locais, à medida que as circunstâncias o permitam, a saber:

1º Uma biblioteca, onde se encontrarão reunidas todas as obras que interessam ao Espiritismo, e que poderão ser consultadas no mesmo lugar ou dadas em leitura;

2º Um museu, onde serão reunidas as primeiras obras da arte espírita, os trabalhos mediúnicos mais notáveis, os retratos dos adeptos que tiverem muito mérito da causa pelo seu devotamento, os dos homens que o Espiritismo honra, embora estranhos à Doutrina, como benfeitores da Humanidade, grandes gênios missionários do progresso, etc.

3º Um dispensário destinado às consultas médicas gratuitas, e ao tratamento de certas afecções, sob a direção de um médico licenciado;

4º Uma caixa de assistência e de previdência, em condições práticas;

5º Um asilo;

6º Uma sociedade de adeptos, tendo sessões regulares.


Sem entrar num exame prematuro a esse respeito, é útil dizer algumas palavras de dois artigos sobre os quais se poderia equivocar-se.
O estabelecimento de uma caixa geral de assistência é uma coisa impraticável, e que apresentaria sérios inconvenientes, assim como o demonstramos num artigo especial (Revista de julho de 1866, página 193).

A comissão não pode se comprometer num caminho que seria logo forçada a abandonar, nem nada empreender que não esteja certa de realizar. Deve ser positiva e não se embalar com ilusões quiméricas; é o meio de caminhar por muito tempo e seguramente; para isso deve, em tudo, ficar nos limites do possível.

Essa caixa de assistência não pode e não deve ser senão uma instituição local, de uma ação circunscrita, cuja prudente organização poderá servir de modelo às, do mesmo gênero, que as sociedades particulares poderiam criar.

É pela sua multiplicidade que podem prestar serviços eficazes, e não centralizando os meios de ação.

Será alimentada:
1º pela porção aplicada a essa destinação sobre a renda da caixa geral do Espiritismo;
2º pelos donativos especiais que lhe serão feitos. Ela capitalizará as somas recebidas de maneira a constituir para si uma renda; será sobre essa renda que dará socorros temporários ou vitalícios, e cumprirá as obrigações de seu mandato, que serão estipuladas em seu regulamento constitutivo.

O projeto de um asilo, na acepção completa da palavra, não pode ser realizado no início, em razão dos capitais que uma tal fundação exigiria, e, além disso, porque é preciso deixar, à administração, o tempo de se assentar e de caminhar com regularidade, antes de pensar em complicar as suas atribuições com empreendimentos, onde poderia fracassar.
Abraçar muitas coisas antes de estar segura dos meios de execução seria uma imprudência. Compreender-se-á facilmente, refletindo-se em todos os detalhes que os estabelecimentos desse gênero comportam. É bom, sem dúvida, ter boas intenções, mas, antes de tudo, é preciso poder realizá-las.

terça-feira, 28 de julho de 2009

VI. EXTENSÃO DA AÇÃO DA COMISSÃO CENTRAL



Um centro de elaboração das idéias espíritas se formou, por si mesmo, na origem, sem desígnio premeditado, pela força das coisas, mas sem nenhum caráter oficial.

Era necessário, porque, se não existisse, qual teria sido o ponto de reunião dos Espíritas disseminados em diferentes países?

Não podendo comunicar suas idéias, suas impressões, suas observações, a todos os outros centros particulares, eles mesmos disseminados, e freqüentemente sem consistência, teriam ficado isolados, e a difusão da Doutrina sofreria com isso.

Era preciso, pois, um ponto onde tudo desembocasse, e de onde tudo pudesse se irradiar.


O desenvolvimento das idéias espíritas, longe de se tornar um centro inútil, fará ainda melhor sentir a sua necessidade, porque a necessidade de se aproximar e de se formar uma união será tanto maior quanto o número de adeptos seja mais considerável.

A constituição do Espiritismo, regularizando o estado das coisas, terá por efeito delas fazer saírem maiores vantagens, e preencher as lacunas que apresente.

O centro que ela criar não será uma individualidade, mas um foco de atividade coletiva, agindo no interesse geral, e onde a autoridade pessoal se apagará.

Mas qual será a extensão do círculo de atividade desse centro?

Está destinado a reger o mundo, e a tornar-se o árbitro universal da verdade?

Se tivesse essa pretensão, isso seria mal compreender o espírito do Espiritismo que, por isso mesmo, proclama os princípios do livre exame e da liberdade de consciência, repudia o pensamento de se erigir em autocracia; desde o início, entraria num caminho fatal.

O Espiritismo tem princípios que, em razão do fato de estarem fundados sobre as leis da Natureza, e não sobre abstrações metafísicas, tendem a se tornar, e serão certamente um dia, os da universalidade dos homens; todos os aceitarão, porque serão verdades palpáveis e demonstradas, como aceitaram a teoria do movimento da Terra; mas pretender que o Espiritismo será, por toda parte, organizado da mesma maneira; que os Espíritas do mundo inteiro se sujeitarão a um regime uniforme, a um mesmo modo de proceder; que deverão esperar a luz de um ponto fixo para o qual deverão fixar os seus olhares, seria uma utopia tão absurda quanto pretender que todos os povos da Terra não formarão um dia senão uma única nação, governada por um único chefe, regulada pelo mesmo código de leis, e sujeita aos mesmos usos.
Se há leis gerais que podem ser comuns a todos os povos, essas leis serão sempre, nos detalhes da aplicação e da forma, apropriadas aos costumes, aos caracteres, aos climas de cada um.

Assim o será com o Espiritismo organizado.

Os Espíritas do mundo inteiro terão princípios comuns que os ligarão à grande família pelo laço sagrado da fraternidade, mas cuja aplicação poderá variar segundo as regiões, sem que, por isso, a unidade fundamental seja rompida, sem formar seitas dissidentes nem lançando a pedra e o anátema, o que seria anti-espírita em primeiro lugar.

Poderão, pois, se formar, e se formarão inevitavelmente, centros gerais em diferentes países, sem outro laço senão a comunhão de crenças e a solidariedade moral, sem subordinação de um ao outro, sem que o da França, por exemplo, tenha a pretensão de se impor aos Espíritas americanos e vice-versa.

A comparação das observações que citamos mais acima é perfeitamente justa.

Há observatórios sobre diferentes pontos do globo; todos, a qualquer nação que pertençam, estão fundados sobre os princípios gerais e reconhecidos da astronomia, o que não os torna, por isso, tributários uns dos outros; cada um regula os seus trabalhos como o entende; comunicam reciprocamente as suas observações, e cada um aproveita, para a ciência, as descobertas de seus confrades.

Ocorrerá o mesmo com os centros gerais do Espiritismo; serão os observatórios do mundo invisível, que se emprestarão reciprocamente o que tiverem de bom e de aplicável aos costumes das regiões onde estiverem estabelecidos: sendo o seu objetivo o bem da Humanidade, e não a satisfação de ambições pessoais.
O Espiritismo é uma questão de fundo; se ligar à forma, seria uma puerilidade indigna da grandeza do objeto; eis porque os centros diversos, que estiverem no verdadeiro espírito do Espiritismo, deverão se estender mão fraterna, e se unirem para combater os seus inimigos comuns: a incredulidade e o fanatismo.

VII. OS ESTATUTOS CONSTITUTIVOS



A redação dos estatutos constitutivos deveria preceder toda execução; se ela fosse confiada a uma assembléia, não seria menos preciso determinar, antecipadamente, as condições a preencher por aqueles que estivessem encarregados desse trabalho.


A falta de base preliminar, a divergência de objetivos, talvez também as pretensões individuais, sem falar das intrigas dos adversários, poderiam conduzir a divisões.


Um trabalho de tão grande importância não poderia ser improvisado; requereria uma grande elaboração, o conhecimento das verdadeiras necessidades da Doutrina adquiridos pela experiência e sérias meditações; para a unidade de vistas, a harmonia e a coordenação de todas as partes do conjunto, não poderia emanar senão da iniciativa individual, salvo para receber mais tarde a sanção dos interessados.


Mas, desde o início, fora necessário ter uma regra, uma rota traçada, um objetivo determinado; estabelecida a regra, caminha-se com mais segurança, sem apalpadelas, sem hesitação.

No entanto, como não é dado a ninguém possuir a luz universal, nem de nada fazer perfeito, que um homem possa se iludir de suas próprias idéias; que outros podem ver o que ele não vê; que a pretensão de se impor a um título qualquer seria abusiva, os estatutos constitutivos seriam submetidos à revisão do próximo congresso que poderia trazer-lhes as retificações julgadas úteis.

Mas uma constituição, por boa que ela seja, não saberia ser perpétua; o que é bom para um tempo, pode tornar-se insuficiente mais tarde; as necessidades mudam com as épocas e o desenvolvimento das idéias.


Não querendo senão com o tempo que ela cai em desuso, ou que seja um dia violentamente transtornada pelas idéias progressistas, é necessário que ela caminhe com essas idéias.


Há doutrinas filosóficas e sociedades particulares como em política e em religião: seguir ou não seguir o movimento precursor é uma questão de vida ou de morte. No objeto do qual aqui se trata, seria, pois, um erro grave quanto encadear o futuro por uma regra que se declarasse inflexível.

Seria um erro não menos grave o de levar, à constituição orgânica, modificações muitos freqüentes que a tirariam de sua estabilidade: é preciso agir com maturidade e circunspecção; só uma experiência de uma certa duração pode fazer a utilidade real das modificações. Ora, quem pode ser juiz em semelhante caso?


Não é um único homem que não vê geralmente senão do seu ponto de vista: não seria mesmo o autor do trabalho primitivo que poderia ver sua obra com tanta complacência; são os próprios interesses, porque sofrem, de maneira direta e permanente, os efeitos da instituição, e podem sentir por onde ela peca.

A revisão dos estatutos constitutivos far-se-á pelos congressos ordinários, transformados para esse efeito em congressos orgânicos, em épocas determinadas, e se prosseguirá indefinidamente de maneira a mantê-los, sem interrupção, ao nível das necessidades e do progresso das idéias. Fosse isso em mil anos daqui.

As épocas de revisão sendo periódicas e conhecidas antecipadamente, não haveria lugar para apelar, nem convocações especiais. A revisão será não somente um direito, mas um dever para o congresso da época indicada; encontrar-se-á inscrita por antecipação na sua ordem do dia; de sorte que não estará subordinada à boa vontade de ninguém; que ninguém poderá rogar o direito de decidir, de sua autoridade privada, se ela é ou não oportuna. Se, depois da leitura dos estatutos, o congresso julgar que nenhuma modificação é necessária, os declarará mantidos em sua integridade.

Sendo forçosamente limitado o número de membros do congresso, tendo em vista a impossibilidade material de nele reunir todos os interesses, para não se privar das luzes dos ausentes, cada um poderá, em qualquer lugar do mundo que se encontre, no intervalo de dois congressos orgânicos, transmitir à comissão central suas observações, que serão colocadas na ordem do dia para o próximo congresso.

Não é senão num período de quase um quarto de século que se desenha um movimento apreciável nas idéias. Seria, pois, de vinte e cinco anos, que a constituição orgânica do Espiritismo seria submetida à revisão. Esse lapso de tempo, sem ser muito longo, é suficiente para permitir apreciar as novas necessidades e não levar perturbações com modificações muito freqüentes.

No entanto, como é nos primeiros anos que haverá maior trabalho de elaboração, que o movimento social que se opera nesse momento pode fazer surgir necessidades imprevistas até que a sociedade haja se assentado, e que importa aproveitar sem muito atraso, as lições da experiência, as épocas de revisão serão mais aproximadas, mas sempre determinadas antes, até o fim deste século.


No intervalo desses trinta primeiros anos, a constituição estará suficientemente completada e retificada para ter uma estabilidade relativa; é então que poderão começar, sem inconveniente, os períodos de vinte e cinco anos.

Desta maneira, a obra individual primeira, que abrira o caminho, se torna em realidade obra coletiva de todos os interessados, com as vantagens inerentes a esses dois modos, sem ter-lhes os inconvenientes; ela se modifica sob o império das idéias progressivas e da experiência, mas sem abalos, sem precipitações, porque o seu princípio está colocado na própria constituição.

segunda-feira, 27 de julho de 2009

VIII DO PROGRAMA DAS CRENÇAS


A condição absoluta de vitalidade para toda reunião ou associação, qualquer que seja o objeto, é a homogeneidade, quer dizer, a unidade de vistas, de princípios e de sentimentos, a tendência para um mesmo objetivo determinado, em uma palavra, a comunhão de pensamentos.

Todas as vezes que homens se reúnem em nome de uma idéia vaga, jamais chegam a se entender, porque cada um compreende essa idéia à sua maneira. Toda reunião formada de elementos heterogêneos leva em si os germes da sua própria dissolução, porque ela se compõe de interesses divergentes, materiais, ou de amor-próprio, tendendo a um objetivo diferente, que se combatem, e muito raramente estão dispostos a fazer concessões ao interesse comum, ou mesmo à razão; que sofrem a opinião da maioria se não puderem fazê-lo de outro modo, mas que não se reúnem jamais francamente.

Assim o foi até este dia com o Espiritismo; formado gradualmente, em conseqüência de observações sucessiva, como todas as ciências, a aceitação tomou pouco a pouco mais amplitude. A qualidade de Espírita, aplicada sucessivamente a todos os graus da crença, compreende uma afinidade de nuanças, desde a simples crença nos fatos de manifestações, até às mais altas deduções morais e filosóficas; desde aquele que, detendo-se na superfície, nele não vê senão um passatempo de curiosidade, até aquele que procura concordância dos princípios com as leis universais, e suas aplicações aos interesses gerais da Humanidade; enfim, desde aquele que nele não vê senão um meio de exploração em seu proveito, até aquele que nele haure os elementos de sua própria melhoria moral.

Dar-se por Espírita convicto, não indica, pois, de nenhum modo, a medida da crença; essa palavra é muito dita por uns, e muito pouco pelos outros. Uma assembléia na qual se convocasse todos aqueles que se dizem Espíritas, apresentaria um amálgama de opiniões divergentes que não saberiam se assimilar e não desembocariam em nada de sério; sem falar dessas pessoas interessadas em nela semear a discussão, às quais abriria suas portas.

Essa falta de precisão, inevitável no início e durante o período de elaboração, freqüentemente causou equívocos lamentáveis, naquilo que fez atribuir à Doutrina o que não era senão o abuso ou um desvio. Foi em conseqüencia dessa falsa aplicaçã o que é diariamente feita da qualidade de Espírita, que a crítica, que pouco se inquieta com o fundo das coisas, e ainda menos com o lado sério do Espiritismo, pôde encontrar matéria para a zombaria. Que um indivíduo se diga espírita ou pretenda fazer do Espiritismo, o que os prestidigitadores pretendem fazer da física, fosse ele um saltimbanco, é, aos seus olhos, o representante da Doutrina.

Tem-se feito, é verdade, uma distinção entre os bons e os maus, os verdadeiros e os falsos Espíritas, os Espíritas mais ou menos esclarecidos, mais ou menos convencidos, os Espíritas de coração, etc.; mas essas designações, sempre vagas, nada têm de autênticas, nada que as caracterizem quando não se conhece os indivíduos, e quando não se teve ocasião de julgá-los pelas suas obras.

Pode-se, pois, ser enganado pelas aparências. Disso resulta que a qualidade de Espírita, não permitindo senão uma aplicação incompleta, não é uma recomendação absoluta; essa incerteza lança nos espíritos uma espécie de desconfiança que impede estabelecer entre os adeptos um laço sério de confraternidade.

Hoje, que se fixou, entre todos, os pontos fundamentais da Doutrina, e sobre os deveres que incumbem a todo adepto sério, a qualidade de Espírita pode ter um caráter definido que não tinha antes. Um formulário de profissão de fé pode ser estabelecido, e a adesão, por escrito, a esse programa, será um testemunho autêntico da maneira de encarar o Espiritismo. Essa adesão, constatando a uniformidade dos princípios, será, além disso, o laço que unirá os adeptos numa grande família, sem distinção de nacionalidades, sob o império de uma mesma fé, de uma comunhão de pensamentos, de vistas, e de aspirações. A crença no Espiritismo não será mais uma simples aquiescência, freqüentemente parcial, a uma idéia vaga, mas uma adesão motivada, feita com conhecimento de causa, constatada por um título oficial entregue ao adepto. Para evitar os inconvenientes da falta de precisão da qualidade de Espíritas, os signatários da profissão de fé tomarão o título de Espíritas professos.

Essa qualificação, repousando sobre uma base precisa e definida, não dá lugar a nenhum equívoco, permite aos adeptos que professem os mesmos princípios e caminhem no mesmo caminho, se reconhecerem sem outra formalidade senão a declaração de sua qualidade, e, havendo necessidade, a produção de seu título. Uma reunião composta de Espíritas professos, será necessariamente tão homogênea quanto o comporta a Humanidade.

Um formulário de profissão de fé, circunscrito e nitidamente definido, será o caminho traçado; o título de Espírita professo será a palavra de união.

Mas, dir-se-á, esse título é uma garantia suficiente contra os homens de sinceridade duvidosa? Uma garantia absoluta contra a má-fé é impossível, porquanto há pessoas que fazem um jogo dos atos mais solenes; mas convir-se-á que essa garantia é maior do que quando não a havia de todo. Tal, aliás, que se dá sem escrúpulos por aquilo que não é, quando não se trata senão de palavras que se evolam, recua freqüentemente diante de uma afirmação espírita que deixa marcas, e que lhe poderia ser oposta no caso em que se desviasse do caminho reto. Se, entretanto, houvesse os que não fossem retidos por essa consideração, o número deles seria muito pequeno e sem influência. De resto, esse caso está previsto pelos estatutos, e é provido pela disposição especial.

Essa medida terá, inevitavelmente, por efeito afastar das reuniões sérias as pessoas que nela não estariam em seu lugar. Se delas se afastassem alguns Espíritas de boa fé, isso não seria sempre senão aqueles que não estão bastante seguros, por si mesmos, para se afirmar, os timoratos que temem se colocar em evidência, e aqueles que, em todas as circunstâncias, não são jamais os primeiros a se pronunciarem, querendo ver antes como as coisas amadurecerão. Com o tempo, uns se esclarecerão mais completamente, os outros tomarão coragem; até lá nem uns nem os outros poderão contar entre os sólidos defensores da causa. Quanto àqueles que se poderia lamentar, o número deles será pequeno e diminuirá a cada dia.

Não sendo nada perfeito neste mundo, as melhores coisas têm seus inconvenientes; querendo-se rejeitar tudo o que não está deles isento, nada seria admissível. Em tudo é preciso pesar a forma das vantagens e dos inconvenientes; ora, é bem evidente que aqui as primeiras levam a melhor sobre as segundas.

Nem todos aqueles que levam o nome de Espíritas aderem, pois, à constituição, isso é certo; também ela não é senão para aqueles que a aceitarão livre e voluntariamente, porque ela não tem a pretensão de se impor a ninguém.

O Espiritismo, não sendo compreendido do mesmo modo por todo o mundo, a constituição chama àqueles que o encaram do seu ponto de vista, com o objetivo de lhes dar um ponto de apoio quando se encontrarem isolados, de cimentar os laços da grande família pela unidade de crenças. Mas, fiel ao princípio da liberdade de consciência, que a Doutrina proclama como um direito natural. respeita todas as convicções sinceras, e não lança anátema àqueles que têem idéias diferentes; delas não aproveitará menos as luzes que poderão emitir fora de seu seio.

O essencial, pois, é conhecer aqueles que seguem a mesma senda; mas como sabê-lo com precisão? É materialmente impossível aí chegar por interrogatórios individuais, e, aliás, ninguém pode estar investido do direito de perscrutar as consciências. O único meio, o mais simples, o mais legal, é estabelecer um formulário de princípios, resumindo o estado dos conhecimentos atuais que ressaltam da observação, e sancionados pelo ensino geral dos Espíritos, aos quais cada um está livre para aderir. A adesão escrita é uma profissão de fé que dispensa de toda outra investigação, e deixa a cada um sua inteira liberdade.

A constituição do Espiritismo tem, pois, por complemento necessário, um programa de princípios definidos no que toca à crença, sem o qual isso seria uma obra sem importância e sem futuro. Esse programa, fruto da experiência adquirida, será a baliza indicadora do caminho. Para caminhar com segurança, ao lado da constituição orgânica, é preciso a constituição da fé, um credo, se o quiserem, que seja o sinal de referência de todos os aderentes.

Mas esse programa, não mais do que a constituição orgânica, não pode e nem deve acorrentar o futuro, sob pena de sucumbir, cedo ou tarde, sob as opressões do progresso.

Fundado para o estado presente dos conhecimentos, deverá se modificar e se completar à medida que novas observações vierem demonstrar-lhe a insuficiência ou os defeitos. No entanto, essas modificações não devem ser feitas levianamente e nem com precipitação. Serão obras dos congressos orgânicos que, na revisão periódica dos estatutos constitutivos, juntará a do formulário de princípios.

Constituição e credo, caminhando constantemente de acordo com o progresso, sobreviverão na seqüência dos tempos.

domingo, 26 de julho de 2009

IX CAMINHOS E MEIOS.


É deplorável, sem dúvida, ser obrigado a entrar em considerações materiais para atingir um fim todo espiritual; mas é preciso observar que a própria espiritualidade da obra se liga à questão da Humanidade e de seu bem-estar; qe não se trata mais somente da emissão de algumas idéias filosóficas, mas de fundar alguma coisa de positivo e de durável, a extensão e consolidação da Doutrina, à qual será necessário fazer produzir os frutos que ela é suscetível de dar.

Pensar que estamos ainda nos tempos em que alguns apóstolos podiam se pôr a caminho com o seu bastão de viagem, sem cuidado com o seu pouso e seu pão cotidianos, seria uma ilusão logo destruída por uma amarga decepção.

Para fazer alguma coisa de sério, é preciso se submeter às necessidades que os costumes, da época em que se vive, impõem; essas necessidades são diferentes das dos tempos da vida patriarcal; o próprio interesse do Espiritismo exige, pois, que se calculem os seus meios de ação para não ser detido em caminho. Calculemos, pois, uma vez que estamos num século em que é necessário contar.

As atribuições da comissão central são bastante numerosas, como se vê, para necessitar uma verdadeira administração. Tendo cada membro funções ativas e assíduas, se não se usasse senão homens de boa vontade, os trabalhos poderiam sofrer com isso, porque ninguém teria o direito de censurar os negligentes. Para a regularidade do trabalho e da expedição dos negócios, é necessário ter homens com a assiduidade dos quais se possa contar, e cujas funções não sejam simples atos de complacência. Quanto mais tivessem independência pelos seus recursos pessoais, menos se sujeitariam a ocupações assíduas; se não o têm, não podem dar o seu tempo. É preciso, pois, que sejam remunerados, assim como o pessoal administrativo; com isso, a Doutrina ganhará em força, em estabilidade, em pontualidade, ao mesmo tempo que esse será um meio de prestar serviço às pessoas que poderiam dele ter necessidade.

Um ponto essencial, na economia de toda administração previdente, é que a sua existência não repouse sobre produtos eventuais, que possam fazer falta, mas sobre recursos fixos, regulares, de maneira a que sua marcha, haja o que houver, não possa ser entravada. É necessário, pois, que as pessoas que serão chamadas a dar o seu concurso não possam conceber nenhuma inquietação quanto ao seu futuro.

Ora, a experiência demonstra que se devem considerar como essencialmente aleatórios todos os recursos que não repousem senão sobre o produto de cotizações, sempre facultativas, quaisquer que sejam as obrigações contratadas, e de uma arrecadação sempre difícil. Assentar despesas permanentes e regulares sobre recursos eventuais, seria uma falta de previdência que se poderia um dia lamentar. As conseqüências são menos graves, sem dúvida, quando se trata de fundações temporárias que duram o que elas podem; mas aqui é uma questão de futuro. A sorte de uma admistração como esta, não pode estar subordinada às chances de um negócio comercial; deve ser, desde o seu início, senão tão florescente, pelo menos tão estável quanto o será daqui a um século. Quanto mais a sua base seja sólida, menos estará exposta aos golpes da intriga.

Em semelhante caso, a mais vulgar prudência quer que se capitalizem, de maneira inalienável, os recursos à medida que chegam, a fim de constituir uma renda perpétua, ao abrigo de todas as eventualidades. A administração, regulando suas despesas sobre a sua renda, a sua existência não pode, em nenhum caso, ser comprometida, uma vez que terá sempre os meios de funcionar. No começo, pode ser organizada numa pequena escala; os membros da comissão podem ser provisoriamente limitados a cinco ou seis, o pessoal e as despesas administrativas reduzidos à sua mais simples expressão, salvo para proporcionar o desenvolvimento e o crescimento dos recursos e das necessidades da causa, mas ainda seria preciso o necessário.

Foi para preparar os caminhos da instalação que consagramos, até este dia, o produto dos nossos trabalhos, assim como dissemos mais acima. Se os nossos meios pessoais não nos permitem fazer mais, teremos pelo menos a satisfação de ter-lhe posto a primeira pedra.
Suponhamos, pois, que, por uma via qualquer, a comissão central esteja, num tempo dado, posta em condições de funcionar, o que supõe uma renda de 25 a 30 mil francos, limitando-se, no início; os recursos de todas as naturezas, de que disporá, em capitais e produtos eventuais, constituirão a Caixa Geral do Espiritismo, que será objeto de uma contabilidade rigorosa.


Estando reguladas as despesas obrigatórias, o excedente da renda aumentará o fundo comum; será proporcionalmente aos recursos desse fundo que a comissão proverá as diversas despesas úteis para o desenvolvimento da Doutrina, sem que jamais disso possa fazer seu proveito pessoal, nem uma fonte de especulação para nenhum de seus membros. O emprego dos fundos e a contabilidade serão, aliás, submetidos à verificação de comissários especiais, delegados para esse efeito pelos congressos ou assembléias gerais.

Um dos primeiros cuidados da comissão será se ocupar com as publicações, desde que para isso houver possibilidade, sem esperar poder fazê-lo com a ajuda da renda; os fundos destinados para esse uso não serão, em realidade, senão um adiantamento, uma vez que reentrarão pela venda das obras, cujo produto retornará ao fundo comum. É um negócio administrativo.

sábado, 25 de julho de 2009

ALLAN KARDEC E A NOVA CONSTITUIÇÃO.


As considerações que encerra o extrato adiante da ata feita a propósito da caixa do Espiritismo, na Sociedade de Paris, em 5 de maio de 1865, por Allan Kardec, sendo o prelúdio da nova constituição do Espiritismo, que elaborava, e a exposição de seus motivos sobre a sua posição pessoal, tem seu lugar necessário neste preâmbulo.

"Falou-se muito dos produtos que eu retirava de minhas obras; seguramente, ninguém crê seriamente em meus milhões, apesar da afirmação daqueles que dizem ter, de boa fonte, que tenho um trem principesco, carruagem a quatro cavalos e que, em minha casa, não se anda senão sobre tapetes de Aubusson. (Revista de junho de 1862, página 179.)

Seja o que for que se haja dito, além disso, o autor de uma brochura que conheceis, e que prova por cálculos hiperbólicos, que meu orçamento de receitas ultrapassa a lista civil do mais poderoso soberano da Europa, porque, na França somente, vinte milhões de espíritas são meus contribuintes (Revista de junho de 1863, página 175), há um fato mais autêntico do que os seus cálculos, é que jamais pedi a ninguém, que ninguém nada deu, jamais, a mim pessoalmente; em uma palavra, que não vivo às custas de ninguém, uma vez que, das somas que foram voluntariamente confiadas, nenhuma parcela dela foi desviada em meu proveito (1).

(1) Aquelas somas se elevavam, naquela época, ao total de 14.100 francos, cujo emprego, em proveito exclusivo da Doutrina, está justificado pelas contas.
"Minhas imensas riquezas proviriam, pois, de minhas obras espíritas. Se bem que essas obras tiveram um sucesso inesperado, basta ser um pouco iniciado nos negócios de livraria, para saber que não é com livros filosóficos que se amontoam milhões em cinco ou seis anos, quando não se tem sobre a venda senão alguns centavos por exemplar. Mas que seja forte ou fraco, esse produto sendo o fruto de meu trabalho, ninguém tem o direito de se imiscuir no emprego que dele faço.

"Comercialmente falando, estou na posição de todo homem que recolhe o fruto de seu trabalho; corro o risco de todo escritor que pode vencer, como pode fracassar.
"Se bem que, sob esse aspecto, não tenha nenhuma conta a prestar, creio útil, pela própria causa à qual estou votado, dar algumas explicações.

"Quem viu o nosso interior outrora, e o vê hoje, pode atestar que nada mudou em nossa maneira de viver desde que me ocupo de Espiritismo; é muito simples agora como o fora outrora. É certo, pois, que meus benefícios, quaisquer que sejam, não servem para me dar os gozos do luxo. Por que isso acontece?

"O Espiritismo, tirando-me da obscuridade, veio me lançar num caminho novo; em pouco tempo encontrei-me arrastado por um movimento que estava longe de prever. Quando concebi a idéia de O Livro dos Espíritos, a minha intenção era de não me pôr em evidência e ficar desconhecido; mas, prontamente ultrapassado, isso não me foi possível: devia renunciar aos meus gostos de solidão, sob pena de abdicar a obra empreendida e que crescia cada dia; foi-me necessário seguir o impulso e tomar-lhe as rédeas. À medida que ela se desenvolvia, um horizonte mais vasto se desenrolava diante de mim e lhe recuava os limites; compreendi, então, a imensidade de minha tarefa, e a importância do trabalho que me restava a fazer para completá-la; as dificuldades e os obstáculos, longe de me assustarem, redobraram a minha energia; vi o objetivo e resolvi alcançá-lo com a assistência dos bons Espíritos. Sentia que não tinha tempo a perder e que não o perdi nem em visitas inúteis, nem em cerimônias ociosas; essa foi a obra de minha vida; dei-lhe todo o meu tempo, sacrifiquei-lhe o meu repouso, a minha saúde, porque o futuro estava escrito diante de mim em caracteres irrecusáveis.

"Sem nos afastarmos de nosso gênero de vida, essa posição excepcional não nos criou menos necessidades às quais, só os meus recursos pessoais, muito limitados, não me permitiam prover. Seria difícil imaginar a multiplicidade das despesas que ela puxa e que teria evitado sem isso.

"Pois bem, senhores, o que me proporcionou esse suplemento de recursos foi o produto de minhas obras. Digo-o com alegria, foi com o meu próprio trabalho, com os frutos de minhas vigílias que provi, em maior parte pelo menos, às necessidades materiais da instalação da Doutrina. Trouxe assim uma considerável cota-parte para a caixa do Espiritismo; aqueles que ajudam a propagação das obras, não poderão, pois, dizer que trabalham para me enriquecer, uma vez que o produto de todo livro vendido, de toda assinatura da Revista, aproveita à Doutrina e não ao indivíduo.

"Não era tudo prover ao presente; era necessário também pensar no futuro, e preparar uma fundação que, depois de mim, pudesse ajudar aquele que me substituirá na grande tarefa que terá que cumprir; essa fundação, sobre a qual devo me calar ainda, se liga à propriedade que tenho, e foi em vista disso que apliquei uma parte de meus produtos para melhorá-la. Como estou longe dos milhões, com os quais me gratificaram, duvido muito que, apesar de minhas economias, meus recursos não me permitirão jamais dar, a essa fundação, o complemento que gostaria de ver em minha vida; mas, uma vez que a sua realização está nos objetivos de meus guias espirituais, se não o faço por mim mesmo, é provável que, um dia ou outro, isso se fará. À espera, elaboro-lhe os planos.

"Longe de mim, senhores, o pensamento de tirar a menor vaidade do que venho de vos expor; foi necessária a perseverança de certas diatribes para me obrigar, embora contra a vontade, a romper o silêncio sobre alguns dos fatos que me concernem. Mais tarde, todos aqueles que a malevolência se empenhou em desnaturar serão dados à luz por documentos autênticos, mas o tempo dessas explicações ainda não chegou; a única coisa que me importava para omomento, era que fôsseis edificados sobre a destinação dos fundos que a Providência fez passar por minhas mãos, qualquer que lhe seja a origem. Não me considero senão como depositário, mesmo daqueles que eu ganho, com mais forte razão daqueles que me são confiados.

Alguém me perguntou, um dia, sem curiosidade, bem entendido, mas por puro interesse pela coisa, o que eu faria com um milhão, se o tivesse. Respondi-lhe que hoje seu emprego seria muito diferente do que o foi no princípio.

Outrora, teria feito a propaganda com uma grande publicidade; agora, reconheço que isso teria sido inútil, uma vez que os nossos adversários dela estão encarregados com seus gastos. Não me colocando, então, em minhas mãos grandes recursos à minha disposição, para esse fim, os Espíritos quiseram provar que o Espiritismo deveria o seu sucesso à sua própria força.

"Hoje, que o horizonte se alarga, que o futuro sobretudo se desenrola, necessidades de uma ordem muito diferente se fazem sentir. Um capital, como aquele que supondes, receberia um emprego mais útil. Sem entrar nos detalhes que seriam prematuros, direi simplesmente que uma parte serviria para converter minha propriedade em uma casa especial de asilo espírita, cujos habitantes recolheriam benefícios da nossa Doutrina moral; a outra para constituir uma renda inalienável destinada: 1º à manutenção do estabelecimento; 2º para assegurar uma existência independente àquele que me sucederá e àqueles que o ajudarão em sua missão; 3º para subvencionar as necessidades correntes do Espiritismo, sem correr o risco de produtos eventuais, como sou obrigado a fazê-lo, uma vez que a maior parte de meus recursos repousa sobre o meu trabalho, que terá um fim.

"Eis o que farei; mas se essa satisfação não me for dada, sei que, de uma maneira ou de outra, os Espíritos que dirigem omovimento proverão a todas as necessidades em tempo útil; é porque não me inquieto de nenhum modo, e me ocupo daquilo que para mim é a coisa essencial: o término dos trabalhos que me restam a terminar. Isto feito, partirei quando aprouver a Deus me chamar."

Ao que disse, então, Allan Kardec, acrescenta hoje: Quando a comissão for organizada, dela faremos parte a titulo de simples membro, tendo nossa parte de colaboração, sem reivindicar, para nós, nem supremacia, nem título, nem qualquer privilégio.

Se bem que parte ativa da comissão, não seremos nenhuma carga ao orçamento, nem por emolumentos, nem por indenizações de viagens, nem por uma causa qualquer; se jamais pedimos nada a ninguém para nós, o faríamos ainda menos nesta circunstância; nosso tempo, nossa vida, todas as nossas forças físicas e intelectuais pertencerão à Doutrina.

Declaramos, pois, formalmente, que nenhuma parte dos recursos dos quais disporá a comissão será desviada em nosso proveito.

A ela trazemos, ao contrário, a nossa cota-parte:
1º Pela entrega do produto de nossas obras feitas e a fazer;
2º Pela aplicação de valores mobiliários e imobiliários.
Quando a Doutrina for organizada pela constituição da comissão central, nossas obras se tornarão propriedade do Espiritismo, na pessoa dessa mesma comissão, que delas terá a gerência e dará os cuidados necessários à sua publicação, pelos meios mais próprios a popularizá-los. Deverá igualmente se ocupar de sua tradução nas principais línguas estrangeiras.

A Revista foi, até este dia, e não poderia ser senão uma obra pessoal, tendo em vista que ela faz parte de nossas obras doutrinárias, servindo em tudo de anais ao Espiritismo. É lá que todos os princípios novos são elaborados e postos ao estudo. Era, pois, necessário que ela conservasse seu caráter individual para a fundação da unidade.

Fomos muitas vezes solicitados a fazê-la aparecer em épocas mais próximas; por lisonjeiro que fosse para nós esse desejo, não pudemos a ele aceder; primeiro, porque o tempo material não nos permitia esse aumento de trabalho, e, em segundo lugar, porque ela não deveria perder o seu caráter essencial, que não é o de um jornal propriamente dito.

Hoje, que a nossa obra pessoal se aproxima de seu termo, as necessidades não são mais as mesmas; a Revista se tornará, como as nossas outras obras, feitas e a fazer, propriedade coletiva da comissão, que lhe tomará a direção, para maior utilidade ao Espiritismo, sem que renunciemos, por isso, a lhe dar a nossa colaboração.


Para completar a obra doutrinária, resta-nos publicar várias outras obras, que dela não são a parte menos difícil, nem a menos penosa. Se bem que delas possuamos todos os elementos, e que o programa lhes esteja traçado até o último capítulo, poderíamos dar-lhes cuidados mais assíduos e ativá-las se, pela instituição da comissão central, estivéssemos livres de detalhes que absorvem uma grande parte de nosso tempo.

O primeiro período do Espiritismo foi consagrado ao estudo dos princípios e das leis cujo conjunto deveria constituir a Doutrina, em uma palavra, preparar os materiais, ao mesmo tempo que, pela divulgação da idéia, a semente estava lançada, mas que, semelhante àquela da parábola do Evangelho, não deveria frutificar por toda parte igualmente. A criança cresceu; está adulta, e o momento é chegado em que, sustentada por adeptos sinceros e devotados, deve caminhar ao objetivo que lhe está traçado, sem ser entravada pelos retardatários.

Mas como fazer essa triagem? Quem ousaria tomar a responsabilidade de um julgamento a ser feito sobre as consciências individuais? O melhor era, pois, que essa triagem se fizesse por si mesma, e para isso o meio era muito simples; bastava plantar uma bandeira, e dizer: aqueles que a adotam seguem-na!

Tomando a iniciativa da constituição do Espiritismo, usamos de um direito comum, o que tem todo homem de completar, como o entende, a obra que começou, e de ser juiz da oportunidade; desde o instante em que cada um está livre para se reunir ou não, ninguém pode se lamentar de sofrer uma pressão arbitrária. Criamos a palavra Espiritismo pelas necessidades da causa; temos muito o direito de determinar-lhe as aplicações, e de definir as qualidades e as crenças do verdadeiro espírita. (Revista Espírita, abril de 1866, página III).

Segundo tudo o que precede, compreender-se-á facilmente o quanto era impossível e prematuro estabelecer essa constituição no início. Se a Doutrina Espírita estivesse formada com todas as peças, como toda concepção pessoal, teria sido completada desde o primeiro dia, e, desde então, nada teria sido mais simples do que constituí-la; mas como não foi ela feita senão gradualmente, em conseqüência de aquisições sucessivas, a constituição teria, sem dúvida, reunido todos os amantes de novidades, mas teria sido logo abandonada por aqueles que não lhe teriam aceito todas as conseqüências.

Mas, dir-se-á talvez, não é uma cisão que estabeleceis entre os adeptos? Fazendo dois campos, não é enfraquecer a falange?

Todos aqueles que se dizem espíritas não pensam do mesmo modo sobre todos os pontos, a divisão existe de fato, e é bem mais prejudicial porque pode chegar que não se saiba se, num Espírita, se tem um aliado ou um antagonista. O que faz a força é o universo; ora, uma união franca não poderia existir entre pessoas interessadas, moral e materialmente, a não seguir o mesmo caminho, e que não perseguem o mesmo objetivo. Dez homens sinceramente unidos por um pensamento comum são mais fortes do que cem que não se entendem. Em semelhante caso, a mistura de objetivos divergentes tira a força de coesão entre aqueles que quereriam andar juntos, absolutamente como um líquido que, se infiltrando em um corpo, é um obstáculo para a agregação das moléculas.

Se a constituição tem por efeito diminuir momentaneamente o número aparente dos espíritas, terá por conseqüência inevitável dar mais força àqueles que caminharão de comum acordo para a realização do grande objetivo humanitário que o Espiritismo deve alcançar. Conhecer-se-ão e poderão se estender a mão de um canto do mundo ao outro.

Além disso, ela terá por efeito opor uma barreira às ambições que, se impondo, tentariam desviá-lo em seu proveito, e de fazê-lo desviar de sua rota. Tudo está calculado em vista desse resultado, pela supressão de toda autocracia ou supremacia pessoal.

sexta-feira, 24 de julho de 2009

CREDO ESPÍRITA


Preâmbulo


Os males da Humanidade vêm da imperfeição dos homens: é pelos seus vícios que se prejudicam uns aos outros. Enquanto os homens forem viciosos, serão infelizes, por que a luta dos interesses engendra, sem cessar, misérias.

Boas leis contribuem, sem dúvida, para a melhoria do estado social, mas são impotentes para assegurar a felicidade da Humanidade, porque não fazem senão comprimir as más paixões, sem aniquilá-las; em segundo lugar, porque são mais repressivas do que moralizadoras, e elas não reprimem senão os atos maus mais salientes, sem destruir a causa.

Aliás, a bondade das leis está em razão da bondade dos homens; enquanto estes estiverem dominados pelo orgulho e pelo egoísmo, farão leis em proveito das ambições pessoais. A lei civil não modifica senão a superfície; só a lei moral pode penetrar o foro interior da consciência e reformá-lo.

Estando, pois, admitido que é a contusão causada pelo contato dos vícios que torna os homens infelizes, o único remédio para os seus males está no seu aperfeiçoamento moral. Uma vez que as imperfeições são a fonte dos males, a felicidade aumentará à medida que as imperfeições diminuirem.

Por boa que seja uma instituição social, se os homens são maus, falseá-la-ão e lhe desnaturarão o espírito para explorá-la em seu proveito. Quando os homens forem bons, farão boas instituições e elas serão duráveis, porque todos terão interesse em sua conservação.

A questão social não tem, portanto, o seu ponto de partida na forma de tal ou tal instituição; está inteiramente no aperfeiçoamento moral dos indivíduos e das massas.


Aí está o princípio, a verdadeira chave da felicidade da Humanidade, porque então os homens não pensarão mais em se prejudicarem uns aos outros. Não basta colocar um verniz sobre a corrupção, é a corrupção que é preciso extinguir.

O princípio do aperfeiçoamento está na natureza das crenças, porque as crenças são o móvel das ações e modificam os sentimentos; está também nas idéias inculcadas desde a infância e identificadas com o Espírito, e nas idéias que o desenvolvimento ulterior da inteligência e da razão podem fortificar, e não destruir. Será pela educação, mais ainda do que pela instrução, que se transformará a Humanidade.

O homem que trabalha seriamente pelo seu próprio aperfeiçoamento assegura a sua felicidade desde esta vida; além da satisfação de sua consciência, isenta-se das misérias, materiais e morais, que são a conseqüência inevitável de suas imperfeições.


Terá a calma porque as vicissitudes não farão senão de leve roça-lo; terá a saúde porque não usará o seu corpo para os excessos; será rico, porque se é sempre rico quando se sabe contentar-se com o necessário; terá a paz da alma, porque não terá necessidades factícias, não será mais atormentado pela sede das honras e do supérfluo, pela febre da ambição, da inveja e do ciúme; indulgente para com as imperfeições de outrem, delas sofrerá menos; excitarão a sua piedade e não a sua cólera; evitando tudo o que pode prejudicar o seu próximo, em palavras e em ações, procurando, ao contrário, tudo o que pode ser útil e agradável aos outros, ninguém sofrerá com o seu contato.

Assegura a sua felicidade na vida futura, porque, quanto mais estiver depurado, mais se elevará na hierarquia dos seres inteligentes, e logo deixará esta Terra de provas por mundos superiores; porque o mal que tiver reparado nesta vida não terá mais que reparar em outras existências; porque, na erraticidade, não encontrará senão seres amigos e simpáticos, e não será atormentado pela visão incessante daqueles que teriam do que se lamentar dele.

Que homens, vivendo juntos, estejam animados desses sentimentos, serão tão felizes quando o comporta a nossa Terra; que, gradualmente, esses sentimentos ganham todo um povo, toda uma raça, toda a Humanidade, e o nosso globo tomará lugar entre os mundos felizes.

É uma quimera, uma utopia? Sim, para aquele que não crê no progresso da alma; não, para aquele que crê em sua perfectibilidade indefinida.

O progresso geral é a resultante de todos os progressos individuais; mas o progresso individual não consiste somente no desenvolvimento da inteligência, na aquisição de alguns conhecimentos; isso não é senão uma parte do progresso, e que não conduz necessariamente ao bem, uma vez que se vêem homens fazerem muito mau uso de seu saber; consiste, sobretudo, no aperfeiçoamento moral, na depuração do Espírito, na extirpação dos maus germes que existem em nós; aí está o verdadeiro progresso, o único que pode assegurar a felicidade da Humanidade, porque é a própria negação do mal.

O homem mais avançado em inteligência pode fazer muito mal; aquele que é avançado moralmente, não fará senão o bem. Há, pois, interesse para todos no progresso moral da Humanidade.

Mas o que fazem o aperfeiçoamento e a felicidade das gerações futuras, para aquele que crê que tudo acaba com a vida? Que interesse tem em se aperfeiçoar, em se constranger, em domar as suas paixões, de privar-se pelos outros? Não tem nenhum; a própria lógica lhe diz que seu interesse está em gozar depressa e por todos os meios possíveis, uma vez que, amanhã talvez, não será mais nada.

A doutrina do niilismo é a paralisia do progresso humano, porque circuscreve a visão do homem sobre o imperceptível ponto da existência presente; porque restringe as idéias e as concentra forçosamente sobre a vida material; com essa doutrina, o homem não sendo nada antes, nada depois, todas as relações sociais cessam com a vida, a solidariedade é uma palavra vã, a fraternidade uma teoria sem raízes, a abnegação em proveito de outrem um logro, o egoísmo com a sua máxima: cada um por si, um direito natural, a vingança um ato de razão; a felicidade está para o mais forte e os mais espertos; o suicídio, o fim lógico daquele que, ao cabo de recursos e expedientes, não espera mais nada, e não pode se tirar do lodaçal. Uma sociedade fundada sobre o niilismo, levaria em si o germe da próxima dissolução.

Outros, porém são os sentimentos daquele que tem fé no futuro; que sabe que nada do que adquire em saber e em moralidade não está perdido para ele; que o trabalho de hoje trará frutos amanhã; que ele mesmo fará parte dessas gerações futuras mais avançadas e mais felizes. Sabe que, trabalhando para os outros, trabalhará para si mesmo. Sua visão não se detém na Terra: ela abarca o infinito dos mundos que serão um dia sua morada; entrevê o lugar glorioso que será seu quinhão, como o de todos os seres chegados à perfeição.

Com a fé na vida futura, o círculo das idéias se alarga; o futuro está para si; o progresso pessoal tem um objetivo, uma utilidade efetiva. Da continuidade das relações entre os homens, nasce a solidariedade; a fraternidade está fundada sobre uma lei natural e sobre o interesse de todos.

A crença na vida futura, portanto, é o elemento de progresso, porque é o estimulante do Espírito: só ela pode dar coragem nas provas, porque lhe fornece a razão, a perseverança na luta contra o mal, porque mostra um objetivo. É, pois, em consolidar essa crença no espírito das massas que é preciso se ligar.

No entanto, essa crença é inata no homem; todas as religiões a proclamam; por que não deu, até este dia, os resultados que se deve dela esperar? É que, em geral, é apresentada em condições inaceitáveis para a razão. Tal como a mostram, rompe todas as relações com o presente; desde que se deixa a Terra, torna-se estranho à Humanidade; nenhuma solidariedade existe entre os mortos e os vivos; o progresso é puramente individual; trabalhando para o futuro, não se trabalha senão para si, não se pensa senão em si, e ainda por um objetivo vago que nada tem de definido, nada de positivo sobre o que o pensamento possa repousar com segurança; é, enfim, porque é antes uma esperança do que uma certeza material. Disso resulta em uns a indiferença, em outros a exaltação mística que, isolando o homem da Terra, é essencialmente prejudicial ao progresso real da Humanidade, porque negligencia os cuidados do progresso material, ao qual a Natureza lhe faz um dever concorrer.

Entretanto, por incompletos que sejam os resultados, não são menos reais. Quantos homens foram encorajados e sustentados no caminho do bem por essa esperança vaga!

Quantos se detiveram sobre a rampa do mal pelo medo de comprometer o futuro?


Quantas nobres virtudes essa crença não desenvolveu! Não desdenhemos as crenças do passado, embora imperfeitas que elas sejam, quando conduzem ao bem: estão em relação com o grau avançado da Humanidade.

Mas a Humanidade progredindo, quer crenças em harmonia com as novas idéias. Se os elementos da fé ficam estacionários, e são ultrapassados para o Espírito, perdem toda influência, e o bem que produziram num tempo não pode prosseguir, porque não estão mais à altura das circunstâncias.

Para que a doutrina da vida futura leve, doravante, os frutos que dela se deve esperar, é preciso, antes de tudo, que ela satisfaça completamente a razão; que responda à idéia que se tem da sabedoria, da justiça e da bondade de Deus; que não possa receber nenhum desmentido da ciência; é preciso que a vida futura não deixe no Espírito nem dúvida, nem incerteza; que seja tão positiva quanto a vida presente, da qual é a continuação, como o dia de amanhã é a continuação da véspera; é necessário que a vejam, que a compreendam, que a toquem, por assim dizer, com o dedo; é preciso, enfim, que a solidariedade do passado, do presente e do futuro, através das diferentes existências, seja evidente.

Tal é a idéia que o Espiritismo dá da vida futura; é o que lhe faz a força, é que isso não é uma concepção humana, que não teria senão o mérito de ser mais racional, mas sem mais de certeza do que as outras. É o resultado dos estudos feitos sobre os exemplos fornecidos por diferentes categorias de Espíritos que se apresentam nas manifestações, o que permitiu explorar a vida extracorpórea em todas as suas fases, desde o alto até o mais baixo da escala dos seres. As peripécias da vida futura não são, pois, mais uma teoria, uma hipótese mais ou menos provável, mas um resultado de observações; são os próprios habitantes do mundo invisível que vêm descrever o seu estado, e é tal situação que a imaginação mais fecunda não teria podido conceber, se não fosse apresentada aos olhos do observador.

Dando a prova material da existência e da imortalidade da alma, nos iniciando nos mistérios do nascimento, da morte, da vida futura, da vida universal, tornando-nos palpáveis as conseqüências inevitáveis do bem e do mal, a Doutrina Espírita faz, melhor do que todas as outras, ressaltar a necessidade de aperfeiçoamento individual. Por ela o homem sabe de onde vem, para onde vai, por que está sobre a Terra; o bem tem um objetivo, uma utilidade prática; ela não forma o homem somente para o futuro, forma-o também para o presente, para a sociedade; pelo seu aperfeiçoamento moral, os homens preparam sobre a Terra o reino de paz e de fraternidade.

A Doutrina Espírita é, assim, o mais poderoso elemento moralizador, naquilo em que ela se dirige, ao mesmo tempo, ao coração, à inteligência e ao interesse pessoal bem compreendido.

Por sua própria essência, o Espiritismo toca em todos os ramos dos conhecimentos físicos, metafísicos e da moral; as questões que ele abarca são inumeráveis; no entanto, podem se resumir nos pontos seguintes que, sendo considerados como verdades adquiridas, constituem o programa das crenças espíritas.

PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS

PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS DA DOUTRINA ESPÍRITA, CONSIDERADOS COMO VERDADES ADQUIRIDAS.
A morte corpórea de Allan Kardec interrompeu as Obras desse Espírito eminente; este volume termina sobre um ponto de interrogação, e muitos leitores quereriam vê-lo resolvido logicamente, como o sabia fazer o douto professor em Espiritismo; sem dúvida, isso deveria ser assim.
No Congresso espírita e espiritualista internacional de 1890, os delegados declararam que, desde 1869, os estudos seguintes tinham revelado coisas novas, e que, segundo o ensinamento preconizado por Allan Kardec, alguns dos princípios do Espiritismo, sobre os quais o mestre baseara seu ensinamento, deveriam ser colocados no ponto e de acordo com os progressos da ciência há 20 anos.
Essa corrente de idéias, comum aos delegados vindos de todas as partes da Terra, provou que um volume novo deveria ser feito, para casar o ensinamento de Allan Kardec com aquele que nos dá, constantemente, a procura da verdade.
Essa será a obra da Comissão de propaganda; contamos muito com os bons conselhos de nosso F.E.S. que provou ao Congresso a sua competência, sobre as mais altas questões filosóficas, para secundar a comissão nessa composição de um trabalho coletivo, sem cessar progressivo; esse volume deverá, ele mesmo, a seu turno, ser posto ao ponto , quando um novo Congresso lhe terá decidido. "A ciência, disse Allan Kardec, está chamada a constituir a verdadeira gênese segundo as leis da Natureza.

"As descobertas da ciência glorificam a Deus em lugar de rebaixá-lo; não destróem senão o que os homens edificaram sobre as idéias falsas que se fizeram de Deus.
"O Espiritismo, caminhando com o progresso, não será jamais ultrapassado, porque se novas descobertas lhe demonstrarem que estava no erro sobre um ponto, modificar-se-á sobre esse ponto; se uma nova verdade se revela, ele a aceita."
(A Gênese, pág. 39.) - P.G.LEYMARIE.

ALLAN KARDEC, O CODIFICADOR

Allan Kardec, o bom senso encarnado.