quarta-feira, 29 de julho de 2009

IV. COMISSÃO CENTRAL


Durante o período de elaboração, a direção do Espiritismo teve que ser individual; era necessário que todos os elementos constitutivos da Doutrina, saídos no estado embrionário de uma multidão de focos, desembocassem num centro comum, para ali serem controlados e confrontados, e que um só pensamento presidisse à sua coordenação para estabelecer a unidade no conjunto e a harmonia em todas as partes.


Se fora de outro modo, a Doutrina parecer-se-ia a um mecanismo cujas rodagens não se engrenariam com precisão umas com as outras.

Já o dissemos, porque é uma verdade incontestável, claramente demonstrada hoje: a Doutrina não poderia sair de todas as peças de um só centro, como toda a ciência astronômica de um só observatório; e todo centro que tentasse constituí-la sobre as suas únicas observações, teria feito alguma coisa incompleta e se encontraria, numa infinidade de pontos, em contradição com os outros. Se mil centros tivessem querido fazer a sua doutrina, não haveria dois semelhantes sobre todos os pontos. Se estivessem de acordo pelo fundo, estariam inevitavelmente diferentes pela forma; ora, como há muitas pessoas que vêem a forma antes do fundo, teria havido tantas seitas quanto as formas diferentes.


A unidade não poderia sair senão do conjunto e da comparação de todos os resultados parciais; por isso, a concentração do trabalho era necessária. (A Gênese, cap. I, Caracteres da revelação espírita, nº 54 e seguintes.)

Mas o que era uma vantagem por um tempo, tornar-se-ia mais tarde um inconveniente. Hoje, que o trabalho de elaboração está terminado, no que concerne às questões fundamentais; que os princípios gerais da ciência estão estabelecidos, a direção, da individualidade que deve ter sido de começo, deve tornar-se coletiva; primeiro, porque chega um momento em que seu peso excede as forças de um homem, e, em segundo lugar, porque há mais garantia de estabilidade numa reunião de indivíduos, dos quais cada um não tem senão a sua voz, e que nada podem sem o concurso uns dos outros, do que num único, que pode abusar de sua autoridade e querer fazer prevalecer as suas idéias pessoais.

Em lugar de um chefe único, a direção será entregue a uma comissão central permanente, cuja organização e atribuições serão definidas de maneira a não deixar nada ao arbítrio.

Essa comissão será composta de doze membros titulares, no máximo, que deverão, para esse efeito, reunir certas condições requeridas, e de um número igual de conselheiros.

Completar-se-á, ela mesma, segundo as regras igualmente determinadas, à medida das vagas pela extinção ou outra causa. Uma disposição especial fixará o modo de nomeação dos doze primeiros.

A comissão nomeia o seu presidente por um ano.

A autoridade do presidente é puramente administrativa; ele dirige as deliberações da comissão, zela pela execução dos trabalhos e pela expedição dos assuntos; mas, fora das atribuições que lhe são conferidas pelos estatutos constitutivos, não pode tomar nenhuma decisão sem o concurso da comissão. Portanto, nada de abusos possíveis, nada de alimentos à ambição, nada de pretextos de intrigas e de ciúme, nada de supremacia contundente.

A comissão central será, pois, a cabeça, o verdadeiro chefe do Espiritismo, chefe coletivo, nada podendo sem o consentimento da maioria. Suficientemente numerosa para se esclarecer pela discussão, não o será bastante para que haja confusão.

A autoridade da comissão central será moderada, e seus atos controlados pelos congressos ou assembléias gerais, sobre os quais se falará adiante.

Para o público de adeptos, a aprovação ou a desaprovação, o consentimento ou a recusa, as decisões, em uma palavra, de um corpo constituído, representando uma opinião coletiva, terão forçosamente uma autoridade que elas jamais teriam emanando de um único indivíduo, que não representa senão uma opinião pessoal. Freqüentemente, rejeita-se a opinião de um só, crendo-se humilhante de submeter-se a ela, e aceita-se sem dificuldade, a de vários.

Está bem entendido que se trata aqui de uma autoridade moral, no que concerne à interpretação e à aplicação dos princípios da Doutrina, e não de um poder disciplinar qualquer.

Essa autoridade será, em matéria de Espiritismo, a de uma academia em matéria de ciência.

Para o público estranho, um corpo constituído tem mais ascendência e predominância entre os adversários; sobretudo, apresenta uma força de resistência e possui meios de ação que um indivíduo não poderia ter; luta com infinitamente mais vantagem. Atacam uma individualidade, despedaçam-na, não ocorrendo o mesmo com um ser coletivo.

Há igualmente, num ser coletivo, uma garantia de estabilidade que não existe quando tudo repousa sobre uma só cabeça; que o indivíduo esteja impedido por uma causa qualquer, tudo pode se entravado. Um ser coletivo, ao contrário, se perpetua sem cessar: que perca um ou vários de seus membros, nada periclita.

A dificuldade, dir-se-á, será a de reunir, de maneira permanente, doze pessoas que estejam sempre de acordo.

O essencial é que estejam de acordo sobre os princípios fundamentais; ora, isso será uma condição absoluta de sua admissão, como a de todos os participantes de sua direção.

Sobre as questões pendentes de detalhe, pouco importa a sua divergência, uma vez que é a opinião da maioria que prevalece. Àquele cuja maneira de ver for justa, não faltarão boas razões para justificá-la. Se um deles, contrariado por não poder fazer admitir as suas idéias, se retira, as coisas não seguem menos seu curso, e não haveria lugar de lamentá-lo, uma vez que faria prova de uma suscetibilidade orgulhosa, pouco espírita, e que poderia tornar-se uma causa de perturbação.

A causa mais comum de divisão entre os co-interessados é o conflito dos interesses e a possibilidade, para um, de suplantar o outro em seu proveito. Esta causa não tem nenhuma razão de ser, desde o instante que o prejuízo de um não pode aproveitar aos outros, que são solidários e não podem senão perder em lugar de ganhar com a desunião. Eis uma questão de detalhe prevista na organização.

Admitamos que, entre eles, se encontre um falso irmão, um traidor, ganho pelos inimigos da causa; que poderá ele, uma vez que não tem senão sua voz nas decisões? Suponhamos que, por impossível, a comissão inteira entre num mau caminho: os congressos lá estarão para pô-la em ordem.

O controle dos atos da administração estará nos congressos, que poderão decretar censura ou acusação contra a comissão central, por causa de infração ao seu mandato, de desvio dos princípios reconhecidos, ou de medidas prejudiciais à Doutrina.

É por isso que se apelará ao congresso nas circunstâncias em que se julgue que a sua responsabilidade poderia ser comprometida de maneira grave.

Se, pois, os congressos são um freio para a comissão, esta haure uma nova força em sua aprovação. É assim que esse chefe coletivo realça em definitivo a opinião geral e não pode, sem perigo para si mesmo, se afastar do caminho reto.

As principais atribuições dessa comissão central serão:


1º O cuidado dos interesses da Doutrina e a sua propagação; a manutenção de sua utilidade pela conservação da integridade dos princípios reconhecidos; o desenvolvimento de suas conseqüências;

2º O estudo dos princípios novos, suscetíveis de entrar no corpo da Doutrina;

3º A concentração de todos os documentos e informações que podem interessar ao Espiritismo;

4º A correspondência;

5º A manutenção, a consolidação e a extensão dos laços de fraternidade entre os adeptos e as sociedades particulares de diferentes países;

6º A direção da Revista, que será o jornal oficial do Espiritismo, e à qual poderá ser acrescentada uma outra publicação periódica;

7º O exame e a apreciação das obras, artigos de jornais, e todos os escritos interessando à Doutrina. A refutação dos ataques, se for o caso;

8º A publicação das obras fundamentais da Doutrina, nas condições mais propícias à sua vulgarização. A confecção e a publicação daquelas das quais daremos o plano, e que não tivermos tempo de fazer em nossa vida. Os encorajamentos dados às publicações que poderão ser úteis à causa;

9º A fundação e a conservação da biblioteca, dos arquivos e do museu;

10º A administração da caixa de assistência, do dispensário e do asilo;

11º A administração dos negócios materiais;

12º A direção das sessões da sociedade;

13º O ensino oral;

14º As visitas e instruções às sociedades particulares que se colocarem sob o seu patrocínio;

15º A convocação dos congressos e das assembléias gerais.


Essas atribuições serão repartidas entre os diferentes membros da comissão, segundo a especialidade de cada um, os quais, se for preciso, serão assistidos por um número suficiente de membros auxiliares, ou de simples empregados.

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